Em dezembro a sociedade grega se viu sacudida por uma enorme rebelião da juventude que estalou depois do assassinato de um jovem estudantes nas mãos da polícia. Entre o dia 7 de dezembro e as festas natalinas, houve manifestações de jovens a cada 2-3 dias e enfretamentos com a polícia. Um mês depois podemos fazer um balanço político tendo em conta todos os elementos.
A primeira questão que devemos analisar é o caráter concreto deste movimento. É importante porque dentro da esquerda grega há muita confusão sobre este aspecto. Para a direção reformista de direita do PASOK este movimento foi simplesmente um “protesto cego” contra um incidente de violência policial. Para os dirigentes estalinistas do KKE [N.T.: Partido Comunista Grego], não houve tal movimento nem insurreição, senão um protesto da “juventude pequeno-burguesa”. Os líderes do SYRIZA qualificam o movimento como “insurreição geral da juventude”. Por suposto, todas estas definições refletem mais as opiniões subjetivas destas tendências políticas que a realidade do movimento.
Muitas vezes ao tentar descrever um fenômeno social não é possível encontrar uma palavra que o defina de maneira simples. Não é uma questão escolástica nem tampouco algo que se possa responder com fórmulas gerais abstratas. A verdade é que este movimento foi uma insurreição juvenil com sua principal base entre os estudantes secundaristas. O movimento teve um momento semi-insurrecional, sobretudo com um espírito muito combativo e de sacrifício, mas também uma forte disposição a se enfrentar fisicamente ao coração do Estado, às forças policiais gregas.
Certamente não foram protestos “pequeno-burgueses” como tentaram apresentar os estalinistas. A grande maioria dos estudantes que participaram no movimento procedia de famílias operárias pobres e todos estes estudantes criaram suas próprias formas independentes de coordenação durante a luta.
Por outro lado, não é correto caracterizar o movimento como uma “insurreição popular”. As seitas e os anarquistas utilizam habitualmente estas formulações, demonstraram denovo que para eles só existem duas “cores”, branco ou negro. Para eles a sociedade se enfrenta à “negra” reação ou a uma “insurreição” geral, entre os dois não existem outros matizes.
Na realidade, o movimento operário só mostrou sua simpatia com o movimento, mas não participou ativamente nele. A exceção foi a greve geral de 24 horas no dia 10 de dezembro, que coincidiu com as mobilizações juvenis. Entretanto, também devemos recordar que a greve geral já estava programada antes de que se iniciasse o movimento e que ainda a participação massiva dos trabalhadores expressavam sua solidariedade com os estudantes, depois desse dia, não participaram pelas massivas manifestações estudantis nas portas das delegacias policiais de toda a Grécia nos dias 8 e 9 de dezembro, as principais manifestações do movimento não foram tão massivas, a maior reuniu cerca de 40 mil a 45 mil pessoas.
Sem dúvidas, os responsáveis desta situação são os dirigentes tanto dos partidos de esquerda como dos sindicatos. Com a greve geral de dezembro tinham o potencial de fazer um movimento muito maior no qual se implicaria a classe operária em geral. Assim que com estes dados é evidente que a classe operária não expressou ativamente nenhuma “intenção insurrecional” como tentaram convencer a si mesmos os sectários e sua desafortunada audiência. Por ora, os trabalhadores permitiram que seus filhos e filhas se expressassem com sua linguagem dinâmica que, inevitavelmente, eles utilizarão no futuro próximo. Na realidade, não podemos nem sequer dizer que houve uma “insurreição juvenil” generalizada, como pretendem os dirigentes do SYRIZA, porque a base principal foram os estudantes secundaristas. Os universitários não se mobilizaram massivamente e só uma pequena minoria de jovens trabalhadores ativos participou nas manifestações.
Um movimento traído
O que podemos dizer é que o movimento de dezembro teve um elemento semi-insurrecional, mas que só conseguiu parcialmente uma expressão de massas e teve uma curta duração. As duas manifestações depois das férias de festividades foram pequenas, com a participação de 3 mil a 4 mil pessoas, sobretudo universitários mobilizados por frentes juvenis ultra-esquerdistas e pelo SYRIZA. A razão principal do final prematuro do movimento foi a traição das direções das organizações de massas tradicionais, tanto políticas como sindicais.
Pela primeira vez nos últimos vinte anos vimos como o movimento juvenil saía à rua perante a hostilidade da direção dos dois principais partidos operários. A direção do PASOK [Partido de esquerdas] pediu abertamente aos estudantes para “regressarem às classes”, enquanto que os dirigentes do Partido Comunista (KKE) identificavam o movimento com as ações pequeno-burguesas aventureiras dos anarquistas, e se negaram não só a participar, mas também disseram que não existia tal movimento. A direção do SYRIZA, ainda que tenha apoiado e participado do movimento, depois dos ataques da burguesia adotou uma tática patética e se negou a apoiar ativamente a necessidade de intensificar o movimento e coordená-lo com a luta dos trabalhadores. Tudo isto reflete a total bancarrota dos dirigentes social-democratas e estalinistas que será muito mais óbvia segundo se acelere a luta de classes.
Como resultado desta traição por parte das direções tradicionais, durante a curta duração do movimento o vazio de direção foi preenchido pelos anarquistas e as seitas ultra-esquerdistas. Com suas consignas habituais abstratas e caóticas, como “a besta está nas ruas” ou “ocupemos cada praça” e outras coisas no estilo, sem propor nenhum objetivo claro e nem reivindicações, os anarquistas e seus leais seguidores, os sectários, dirigiram o movimento a um beco sem saída, e empurraram as massas estudantis rapidamente à confusão e o desencanto. Além da hostilidade dos dirigentes dos partidos operários, esta foi a segunda razão pela qual o movimento teve uma vida breve.
Um terceiro fator, e não menos importante, foi o papel do terror de Estado. No momento da escritura deste artigo, 68 jovens continuam presos. A maioria deles de forma alguma participou dos enfrentamentos com a polícia e foram detidos simplesmente porque estavam ao largo [do movimento] ou são imigrantes. A tragédia é que estes jovens enfrentam a acusação de cometer atos de terrorismo e alguns inclusive tem perspectivas de condenação de 6 a 8 anos de prisão!
A ação “Luta revolucionária”, organização que defende o terrorismo individual, foi muito útil para o Estado em sua campanha de terror contra os estudantes. No dia 6 de janeiro feriram seriamente um policial, este incidente foi utilizado para aguçar os sentimentos de simpatia com a polícia entre um setor amplo da população, foi utilizado como a cartada para mais brutalidade policial, deste modo colocaram mais medo entre a juventude e freava sua participação nas manifestações.
Uma situação social explosiva e as perspectivas
O movimento de dezembro foi só o prelúdio das grandes batalhas de classe que virão no futuro imediato. A crise do capitalismo grego se aprofunda e o ambiente na sociedade se mantém explosivo. Pouco depois do movimento juvenil de dezembro, entre o dia 18 e 28 de janeiro, presenciamos mobilizações massivas dos camponeses pobres de toda a Grécia. Vinte e dois mil tratores bloquearam os caminhões nacionais em uma luta muito combativa contra os baixos preços que lhes são oferecidos aos camponeses por seus principais produtos, pelas empresas de alimentação, fora demonstrado a falta de sensibilidade do governo de direita ante o sofrimento dos pequeno-camponeses que se unem devido à pressão da crise atual. A luta dos camponeses contou com uma participação massiva e o débil governo da Nova Democracia teve de destinar 500 milhões de euros em subvenções como a única maneira de evitar outra nova rodada de explosão social.
Esta mobilização dos camponeses data três anos nos quais a maioria dos setores da sociedade mobilizaram contra o governo e os ataques dos capitalistas aos níveis de vida. Vimos os trabalhadores participarem em uma greve geral após outra, dos estudantes universitários e de secundaristas mobilizarem-se reiteradamente, aos comerciantes, inclusive os professores e agora os camponeses. Aqui temos um exemplo claro do potencial revolucionário que existe em cada um dos níveis da sociedade. Com o governo da direita em uma crise profunda e permanente, com os dois partidos burgueses (Nova Democracia e o pequeno Alerta Popular Ortodoxa, o LAOS, como se conhece) conseguindo menos de 33% nas pesquisas, se os partidos operários tivessem uma política revolucionária, a tomada do poder na Grécia poderia ser, sem exagero, uma questão de meses.
Entretanto, a ausência do fator subjetivo revolucionário complica a situação. Inevitavelmente, no próximo período o governo do ND passará à história sob as marteladas da crise econômica e a crescente luta de classes. A pressão sob a direção da Confederação Grega dos Trabalhadores (GSEE) para que organize outra greve geral está acumulando, nesta ocasião contra a onda de demissões nas indústrias. Os trabalhadores terão que passar pela experiência de lutas maiores e pela de outro governo reformista do PASOK, ou possivelmente uma coalizão PASOK-SYRIZA.
Seu instinto de classes lhes levarão no próximo período às idéias mais revolucionárias e efetivas, as idéias do marxismo. Por isso a única solução política real está na luta cotidiana paciente pela construção de uma corrente marxista de massas, com profundas raízes no movimento operário e na juventude grega, como a ferramenta necessária para a vitória decisiva da classe operária contra a burguesia reacionária grega e a construção de uma sociedade verdadeiramente socialista, onde não exista a exploração. A esta tarefa está dedicada a seção grega da Corrente Marxista Internacional, que edita o jornal Marxistiki Foni.
Segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009
Source: Esquerda Marxista