“As ideias do marxismo nunca foram mais relevantes. Enquanto enfrentamos a maior crise do capitalismo desde a Grande Depressão, as ideias de Marx, que desvelam as contradições insolúveis do capitalismo, oferecem o único caminho a seguir”.
“Jeremy Corbyn mergulhou hoje o Trabalhismo em um novo caos ao elogiar Karl Marx como um ‘grande economista’.
“Isso aconteceu quando o líder trabalhista defendeu o Chanceler-sombra John McDonnel por afirmar que as pessoas poderiam aprender muito lendo Das Kapital – a obra-prima econômica dos socialistas revolucionários”.
Essa crônica de choque e horror apareceu no trapo anti-trabalhador, The Sun, que desenterrou o desacreditado ex-parlamentar Trabalhista, Simon Danczuk, para atacar John McDonnel por “estar continuamente obcecado com Karl Marx, com os benefícios do comunismo e com a celebração do reinado de Joseph Stalin”.
Essa provocação grosseira de Danczuk e de The Sun para igualar o marxismo aos crimes de Stalin e do estalinismo é uma mentira velha. O marxismo se opõe ao estalinismo e representa a democracia mais ampla possível – uma democracia dos trabalhadores. Foi precisamente por causa da defesa de Trotsky dessas ideias que Stalin o exilou e assassinou. Na realidade, um rio de sangue separa o genuíno marxismo do estalinismo.
Em uma entrevista na BBC em 2015 com Andrew Marr, Jeremy Corbyn foi questionado sobre seus pontos de vista com relação a Marx. Jeremy disse:
“Marx obviamente analisou o que estava acontecendo de forma brilhante e a filosofia em torno de Marx é fascinante.
“Ele era essencialmente uma figura fascinante… de quem podemos aprender muito”.
Questionado se se considerava um marxista, Jeremy fez uma pausa antes de dizer:
“Esta é uma questão interessante. Não pensei o suficiente sobre isto”.
“Realmente, não li muito de Marx como deveria ter feito”.
Uma declaração tão positiva sobre Marx é um tremendo avanço quando comparada aos pontos de vista de líderes anteriores do trabalhismo. Harold Wilson, por exemplo, disse desdenhosamente que nunca foi além da nota de rodapé da primeira página de O Capital de Marx. Ele sustentava que a solução para os problemas dos trabalhadores “não seria encontrada no Cemitério Highgate”, uma referência ao túmulo de Marx.
Cláusula IV
Naturalmente, os esforços da imprensa Tory para ligar Jeremy Corbyn e John McDonnel a Karl Marx e ao marxismo são uma tentativa de embaraçá-los. Mas não devem ficar envergonhados.
Como uma organização de massa dos trabalhadores, o Partido Trabalhista abraçou diferentes pontos de vista – tanto as tendências pró-capitalistas de direita, quanto as socialistas de esquerda. O trabalhismo sempre conteve uma corrente marxista dentro dele, bem como indivíduos que estavam profundamente influenciados pelo marxismo. De fato, o marxismo esteve presente no Partido Trabalhista desde sua fundação em 1900. Naquela época, o marxista Partido Socialdemocrata, junto a outros grupos socialistas e aos sindicatos, ajudou a estabelecer o Partido Trabalhista. O SDF, inclusive, tinha um assento de reserva em um comitê Executivo de nove. Infelizmente, abandonou o Partido Trabalhista quando este se recusou a adotar o socialismo como meta. No entanto, mais tarde mudou de nome para Partido Socialista Britânico e retornou ao Partido Trabalhista em 1916.
Em 1918, sob o impacto da Revolução Russa, o Partido Trabalhista adotou uma nova constituição socialista, com sua famosa Cláusula Quatro:
“Garantir aos trabalhadores, manuais e intelectuais, todos os frutos de sua indústria e a distribuição mais justa possível dos mesmos com base na propriedade comum dos meios de produção, distribuição e troca, e o melhor sistema alcançável de administração e controle popular de cada indústria ou serviço”.
Esse objetivo socialista de substituir o capitalismo por uma economia pública planificada diferenciou claramente o Partido Trabalhista de todos os demais. Fez parte da Constituição do Partido até que foi abolida por Tony Blair em 1995.
Quando o Partido Comunista foi formado na Grã-Bretanha em 1920, pediu filiação ao Partido Trabalhista, mas foi recusado. No entanto, seus membros também poderiam ser membros do Partido Trabalhista. Vários deputados Trabalhistas eram comunistas, como Shapurji Saklatvala e Walton Newbold, eleitos ambos em 1922. Contudo, em 1925, sob o impacto de uma caça às bruxas de direita, os comunistas foram proibidos de pertencer ao Partido Trabalhista.
Uma inspiração para o movimento dos trabalhadores
A esquerda dentro do Partido Trabalhista reuniu-se em torno do Partido Trabalhista Independente [ILP, em suas siglas em inglês] que, depois da traição de Ramsay MacDonald e da recessão mundial, em 1931, avançou em direção à revolução. O partido publicou o discurso de Copenhagen de Trotsky de 1932, com introdução própria feita pelo deputado James Maxton. Não obstante, o ILP separou-se do Partido Trabalhista.
Na década de 1930, muitos membros importantes do Partido Trabalhista foram influenciados pelas ideias de Marx. John Strachey, Harold Laski, Stafford Crips, Aneurin Bevan, Michael Foot e muitos outros estavam nessa categoria. “Ele [Bevan] era um marxista convencido”, escreveu Michael Foot. “Ele aceitou a ênfase marxista sobre a necessidade de uma teoria completa da mudança social e foi longe o suficiente para aceitar a análise marxista da debilidade e da incapacidade associadas à liderança socialdemocrata” (Foot, Aneurin Bevan 1897-1945, p. 150).
Em 1947, o Partido Trabalhista chegou a reimprimir O Manifesto Comunista de Marx e Engels, com uma introdução de Harold Laski, para assinalar o centenário do documento. O prefácio explicava:
“Ao apresentar este volume centenário de O Manifesto Comunista, com a valiosa Introdução histórica do Professor Laski, o Partido Trabalhista reconhece sua dívida com Marx e Engels como os dois homens que foram a inspiração de todo o movimento da classe trabalhadora.
“O Partido Trabalhista Britânico tem suas raízes na história da Grã-Bretanha…. Mas os socialistas britânicos nunca se isolaram de seus companheiros da Europa continental. Nossas próprias ideias foram diferentes das do socialismo continental que surgiram mais diretamente de Marx, mas nós, também, fomos influenciados por centenas de pensadores e lutadores europeus, e, acima de tudo, pelos autores de O Manifesto.
“A Grã-Bretanha jogou um papel importante na vida e na obra tanto de Marx quanto de Engels. Marx gastou a maior parte de sua vida adulta aqui e está sepultado no Cemitério de Highgate. Engels era filho de Manchester, o próprio símbolo do capitalismo industrial. Quando escreveram sobre a exploração burguesa, basearam-se principalmente na experiência inglesa”.
Tony Benn, um dos líderes mais importantes da esquerda na Grã-Bretanha, foi certamente influenciado pelas ideias de Marx. De acordo com o biógrafo de Michael Foot, Kenneth Morgan, “Ambos [Foot e Ben] renderam homenagem à inspiração de Marx, cujo papel no pensamento socialista britânico foi praticamente ignorado durante os anos da Guerra Fria. Mesmo que nenhum dos dois fosse seriamente um socialista marxista, Marx influenciou a ambos ao longo dos anos. Ambos adotaram a visão de Marx da necessidade histórica e da centralidade da classe. Foot, como vimos, passou muito tempo lendo a dialética marxista em seus dias de Liga Socialista, e adestrou Barbara Betts nos fundamentos da mensagem de Marx. Benn descobriu Marx muito mais tarde na vida, e leu O Manifesto Comunista pela primeira vez aos cinquenta anos de idade” (Morgan, Michael Foot, pp. 407-8).
In Defence of Marxism
Embora muitas das pessoas influenciadas pelo marxismo tenham se movido mais tarde em diferentes direções políticas, isso, no entanto, indica claramente a importância do marxismo como uma tendência influente na história do Partido Trabalhista Britânico.
No final da década de 1970, Tony Benn assumiu a defesa pública do marxismo, que se encontrava sob ataque da imprensa capitalista e de suas sombras no Partido Trabalhista.
“O Manifesto Comunista e muitas outras obras de filosofia marxista sempre influenciaram profundamente o movimento trabalhista britânico e o Partido Trabalhista britânico, fortaleceram nossa compreensão e enriqueceram nosso pensamento”, explicou Benn.
“Seria impensável tentar construir o Partido Trabalhista sem Marx como também o seria estabelecer faculdades universitárias de astronomia, antropologia ou psicologia sem se permitir o estudo de Copérnico, Darwin ou Freud, e ainda esperar que tais faculdades sejam levadas a sério”.
Tony Benn também se referiu à contribuição vital de Trotsky: “Trotsky deve ser lembrado com o primeiro e mais importante dissidente soviético, caçado e depois assassinado por Stalin. Suas críticas ao estalinismo merecem estudo respeitoso e sua exposição desdenhosa do socialismo água com açúcar de alguns líderes trabalhistas nos anos 1920, em seu livro Aonde vai a Grã-Bretanha, dá-lhe direito a um lugar em nossa história”.
O marxismo pode ser definido como a expressão consciente dos processos inconscientes nas mentes das massas. Ele proporciona uma compreensão científica do capitalismo e de como pode ser derrubado. Rejeita a ideia reformista de que se pode mudar a sociedade pouco a pouco. As ideias do reformismo – a tentativa de fazer o capitalismo funcionar sobre uma base humana – revelaram-se falsas. Esta é a principal razão hoje para a crise da socialdemocracia em escala internacional.
As ideias do marxismo nunca foram mais relevantes. À medida em que enfrentamos a maior crise do capitalismo desde a Grande Depressão, as ideias de Marx, que desvelam as contradições insolúveis do capitalismo, oferecem o único caminho real a seguir. Somente com a classe trabalhadora tomando o poder em suas mãos e expropriando os capitalistas, podemos usar os recursos da sociedade em benefício da massa do povo.
Hoje, as ideias do marxismo estão representadas de forma consistente por Socialist Appeal e pela Corrente Marxista Internacional. Os acontecimentos confirmarão essas grandes ideias e lançarão as bases para a propagação do marxismo por todo o movimento trabalhista britânico. A luta pela transformação socialista da sociedade se converterá em realidade para milhões na Grã-Bretanha e internacionalmente.
Artigo publicado em 7 de junho de 2017, no site da Corrente Marxista Internacional (CMI), sob o título “Marxism in the Labour Party”.