Grã-Bretanha: está nascendo um novo movimento político de apoio em massa a Jeremy Corbyn

De 14 de agosto a 10 de setembro será eleito o secretário do Partido Trabalhista da Grã-Bretanha. Pela primeira vez, votarão não somente os filiados como também os simpatizantes do partido, uma novidade que está criando muitos problemas para a ala direita que promovera antes esta medida com a intenção de diluir o peso do voto militante. A candidatura de Jeremy Corbyn, deputado da esquerda trabalhista, está catalisando a raiva e o descontentamento de muitos jovens e trabalhadores e lidera as intenções de voto.

Ontem à tarde [04/08/2015], 2.500 pessoas foram ao centro de Londres para escutar Jeremy Corbyn apresentar uma audaciosa alternativa à austeridade, no que foi o mais recente de uma série de encontros de massas que estão ocorrendo pelo país. O comício foi tão requisitado que, apesar de o enorme salão principal do Camden Centre estar completamente lotado, outras duas salas secundárias ficaram cheias com os apoiadores de Corbyn, enquanto mais centenas aguardavam do lado de fora, incapazes de se espremerem para dentro do edifício.

Inabalável com a enorme audiência, Jeremy tomou tempo para falar quatro vezes, ao dirigir-se a todas as três salas, bem como ao dar um discurso posterior do lado de fora, em cima de um carro de bombeiros, fornecido pelo FBU – o sindicato dos bombeiros, que está apoiando a campanha de Jeremy. Tal é a sede pelas ideias de Jeremy que alguns grupos de adolescentes escalaram as paredes do local para que pudessem ter um vislumbre de seu discurso no salão principal através das janelas.

Jeremy lucidamente descreveu o impacto devastador da austeridade pelo Reino Unido, de milhões de pessoas forçadas a depender de bancos de alimentos, e de uma crise de moradias que levou a uma limpeza social dos pobres de Londres. Ele delineou sua alternativa de sociedade guiada pelos interesses dos “verdadeiros criadores de riquezas” – isso é, as pessoas trabalhadoras comuns.

Owen Jones juntou-se a Corbyn no palco e disse que, com o quão impressionante como a campanha tem sido até agora, ela não deve parar por aqui. Owen argumentou que, se Jeremy ganhar ou perder, essa campanha deve se tornar a plataforma de lançamento de um movimento de massas para mudar a sociedade.

Mark Serwotka, secretário geral do PCS - sindicato de funcionários públicos - também falou. Ele escarneceu os ataques da direita e suas tentativas paternalistas de dissuadir os apoiadores de Corbyn ao argumentar que ele não é capaz de se eleger. Na mera menção de Blair o salão irrompeu em um coro de vaias, demonstrando o desprezo com o qual é visto o ex-primeiro ministro, há muito desacreditado.

O comício de Londres sucedeu uma atividade de 1.500 pessoas em Liverpool e enormes reuniões em Birmingham e Coventry durante a semana passada. Ao mesmo tempo, a campanha está se aproximando do objetivo de arrecadação de £100.000 em doações e praticamente todos os principais apostadores têm agora Jeremy como o favorito para vencer. Vindo o apoio do endosso oficial do sindicato do setor público UNISON, com 1,3 milhão de membros, a campanha está ganhando, aparentemente, uma quantidade de movimento irrefreável.

As difamações dos Blairistas

Esses avanços na campanha ocorrem apesar de uma torrente de ataques a Jeremy, que partem tanto da mídia quanto da ala direita do Partido Trabalhista. Chris Leslie, shadow chancellor [isso é: o porta voz da oposição para assuntos econômicos – NDT] do Partido Trabalhista, juntou-se ao coro dos Blairistas, com suas alegações absurdas de que as políticas econômicas de Jeremy fariam, na realidade, os trabalhadores mais pobres. Completando essa galeria de críticos vigaristas de Corbyn está o ex-dirigente Neil Kinnock, que exibiu suas velhas credenciais McCarthistas por culpar “trotskistas malignos” pelo crescimento do apoio à campanha, bem como por ridicularizar Jeremy por ser “inelegível”. O que um homem que perdeu duas eleições (porque estava muito ocupado travando uma guerra contra a esquerda do Partido Trabalhista) saberia sobre elegibilidade?!

O que é evidente é o quão desacreditados esses políticos profissionais têm se tornado entre a base dos membros do partido, bem como na sociedade em geral. Em vez de minar a campanha, todos os ataques de Blair e cia. apenas servem para fortalecê-la. O sentimento geral aparenta ser: “se Blair é contra, então eu devo ser a favor!”.

Os dirigentes da direita e a imprensa burguesa estão, de forma semelhante, completamente isolados da realidade da sociedade. Como resultado, eles falham em compreender a enorme mudança de consciência que tem ocorrido no último período. Desde 2008, as pessoas comuns pela Europa e pelo resto do mundo têm começado a questionar a necessidade de um sistema que exige cortes em seus padrões de vida para pagar por uma crise que eles não causaram.

Milhões de trabalhadores anseiam por uma alternativa, mas, até agora (pelo menos na Inglaterra), a bancarrota da direção do Partido Trabalhista e dos sindicatos tem impedido esse sentimento de ter uma expressão. Na Escócia, o referendo sobre a independência e o consequente maremoto eleitoral para o SNP [Partido Nacional Escocês – NDT] foi uma expressão do desejo de mudança.

A campanha de Jeremy dá uma voz a esses sentimentos pelo Reino Unido. Esse fenômeno não é exclusivo do Reino Unido, mas é apenas um exemplo de um processo geral, como Stella Christou, uma apoiadora do Socialist Appeal [seção britânica da Corrente Marxista Internacional – NDT], citada em the Guardian, explicou:

“Novos partidos e novas figuras estão emergindo por toda a Europa, e agora está acontecendo aqui. Eles estão estremecendo as fundações da tradicional social-democracia. Jeremy Corbyn está reunindo pessoas descontentes, desmoralizadas e apolíticas”.

Quem você está chamando de apático?

O que é mais perceptível sobre a campanha é o enorme número de jovens envolvidos. A mídia gosta de nos dizer que os jovens são apáticos e não ligam para política. Mas os grupos de adolescentes com os ouvidos pressionados contra as janelas do Camden Centre na noite passada mostram outro cenário. De fato, em certo ponto, o comício foi dirigido por alguns voluntários da campanha. A maioria deles tinha menos de 20 anos de idade e apenas recentemente se envolveu com política, motivada pelo desejo de lutar por uma sociedade melhor. Isso mostra que a campanha está arrastando as mesmas camadas da juventude radicalizada que inundou as ruas para protestar contra os Tories [Partido Conservador – NDT] após as eleições.

Está se tornando claro que estamos testemunhando o nascimento de um novo movimento político – um movimento que tem o potencial de arrastar centenas de milhares para a luta contra a austeridade, caso Jeremy vença. A respeito disso, é possivelmente um desenvolvimento político dos mais importantes do Reino Unido no último período, certamente desde os protestos contra a guerra no Iraque, se não for desde a luta contra o Poll Tax. O que é bastante perceptível na campanha é um senso de otimismo e entusiasmo de todos os envolvidos, de forma parecida em jovens e em pessoas mais velhas, algo completamente ausente em outros lugares.

Apoiadores do Socialist Appeal compartilham esse entusiasmo e nós estamos comprometidos com a campanha para a vitória de Jeremy – mas não devemos ser ingênuos sobre o que isso resultaria. Se Jeremy vencer, isso certamente abrirá uma guerra civil dentro do partido. Os Blairistas não poderiam aprovar tal vitória, não porque eles realmente acreditam que Jeremy é inelegível, mas sim porque o movimento que ele liberou ameaça os interesses da classe dominante que eles representam em seu total compromisso com a austeridade. 

A direita começaria imediatamente uma campanha de sabotagem e trabalharia para remover Jeremy de um jeito ou de outro. Não devemos tomar tais ataques de cabeça baixa, mas devemos estar preparados para os enfrentarmos de cabeça erguida para defender a vontade democrática da maioria dos afiliados do partido.

Vote em Corbyn! Lute pelo Socialismo!

Nesse sentido, discordamos de Jeremy quando ele chama pela “unidade do partido”. O Partido Trabalhista há muito tempo tem sido o lar de dois campos fundamentalmente opostos: aqueles que lutam pelos interesses dos trabalhadores; e os verdadeiros “infiltrados”, que representam os interesses dos patrões. Se Jeremy colocar seu programa em prática, será necessário lutar contra qualquer sabotagem Blairista e remover os carreiristas e os oportunistas do partido. Apenas então poderemos estar realmente unidos na batalha contra os Tories.

Caso Jeremy não ganhe, essa mesma batalha ainda será necessária. Não devemos permitir que os milhares que têm inundado o partido se desanimem e saiam. Devemos combater para organizá-los em uma força que possa continuar a lutar por uma transformação fundamental da sociedade.

Em qualquer caso, o gênio agora está fora da garrafa. Milhares de pessoas têm sido arrastadas para a atividade política. O descontentamento das massas e o desejo por uma mudança radical junto aos trabalhadores e à juventude tem tomado uma forma visível e tangível. Armado com um combativo, militante e audacioso programa socialista, tal movimento não poderia ser parado.

Vote em Corbyn!

Expulse os Blairistas!

Lute pelo Socialismo!

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"As políticas que o Partido Trabalhista precisa para ganhar"

Relato de Nathan Taylor

Se você passasse pela Igreja Batista de Bloomsbury [Bloomsbury Baptist Church – NDT] na noite passada (28 de Julho) e visse as filas dando a volta no quarteirão, você teria pensado que algum tipo de estrela do rock ou pastor americano estava na cidade. Em vez disso, as pessoas estavam enfileiradas para ver um modesto homem de 66 anos. Nos poucos meses desde o início de sua campanha, Jeremy Corbyn se tornou uma das pessoas mais famosas na política britânica. Uma mulher com a qual eu conversei, um membro de longa data do Partido Trabalhista, disse que ela não tinha visto tanto entusiasmo por um político do Partido Trabalhista em décadas. Outros na fila não pareciam sequer ter idade suficiente para votar; e, mesmo assim, lá estavam eles em um comício, tendo discussões acaloradas sobre socialismo.

Dentro do local havia um tremendo burburinho antes do início, com 800 pessoas abarrotadas em cada canto disponível. No palco, a candidata a prefeita de Londres, Diane Abbott, que foi uma das principais oradoras, junto a Jeremy Corbyn, sentou-se pacientemente enquanto os outros oradores falavam. Junto a eles estava Andrew Berry da UNISON, que estava lá, mas não como representante do sindicato; um membro do Partido Trabalhista do conselho do condado de Islington, Claudia Webbe; e Christine Shawcroft do Comitê Executivo Nacional do Partido Trabalhista. A mensagem de todos os oradores foi muito clara: há a necessidade de se ter um movimento coeso anti-austeridade em todos os níveis – nos conselhos municipais, nos sindicatos, e no parlamento.

Quando Jeremy Corbyn finalmente chegou, houveram gritos de alegria e longos aplausos de pé, que acabaram interrompendo o tempo de fala de Diane Abbott. Abbott deu um bom discurso sobre mudar Londres de uma cidade que é um playground dos ricos para uma cidade na qual todos possam pagar para viver. A política que foi mais aplaudida foi a introdução de teto nos aluguéis e a construção de moradias populares, uma questão de particular importância para os londrinos.

Quando Jeremy Corbyn se levantou para falar, o que foi acompanhado por mais aplausos de pé, não havia restado muito para se dizer nas questões específicas, enquanto todos os problemas sobre austeridade, bem-estar, moradias, direitos trabalhistas, etc. já tinham sido tratados pelos oradores anteriores. Na essência, o discurso de Corbyn foi uma ideia geral do tipo de líder que ele queria ser e o tipo de país que ele queria que a Bretanha se tornasse: nomeadamente, um líder que tomará uma posição com princípios contra a injustiça e uma Bretanha que exista para o benefício de muitos, e não de poucos. 

Em particular, Jeremy pontuou que ele não está interessado em políticas identitárias, em ser superior ou em ter brigas mesquinhas no Twitter. Sua calma, seu comportamento reservado e suas respostas diretas às perguntas fazem parte de sua simpatia. Ao final de seu discurso, todos na sala se levantaram e deram uma salva de palmas e gritaram e, enquanto as pessoas saíam às ruas, escutava-se o barulho de discussões políticas.

O entusiasmo por Corbyn é extremamente contagiante, e a energia das camadas da juventude radicalizada que foram arrastadas à campanha faz dela algo particularmente excitante. Entretanto, é importante darmos um passo atrás e observarmos algumas falhas no programa de Corbyn. O que me incomodou nos discursos foi que, de alguma forma, o governo do Partido Trabalhista precisará financiar todas as reformas sociais e reestruturações propostas. A resposta de todos os oradores foi fechar as brechas para o pagamento de impostos que têm sido exploradas pelas grandes empresas que têm negócios em solo britânico. Entretanto, essa não é uma tarefa simples; O presidente francês François Hollande prometeu algo semelhante, mas, quando ele tentou fechar essas brechas, as grandes empresas rapidamente acharam outras. Como resultado, Hollande acabou tendo que implementar a austeridade, apesar de suas promessas na campanha eleitoral.

Apesar dessas limitações, não há dúvidas de que a campanha de Corbyn está dando à política britânica o pontapé que ela precisava. Ela está trazendo de volta as ideias de esquerda para a consciência pública. Temos aqui um político que sai na mídia falando sobre nacionalizar serviços públicos e taxar os ricos e está sendo tratado como uma alternativa séria para o futuro do Reino Unido. Isso não acontece em décadas!

Como Marxistas, nós apoiamos essa campanha e as reformas que Corbyn oferece para melhorar a vida da classe trabalhadora. Entretanto, nós devemos apontar os limites do programa de Jeremy, como mencionado acima. Se a história recente nos ensinou alguma coisa, foi que as reformas progressistas em uma base capitalista não são possíveis. A presente crise do capitalismo tem destruído as bases materiais para as reformas que conquistamos através de lutas no passado. Os ataques do Tory [Partido Conservador – NDT] aos direitos trabalhistas, ao sistema de moradias populares, e ao NHS [serviço público de saúde – NDT] são provas desse fato.

Um simples programa anti-austeridade não é o suficiente. Para torná-lo real e duradouro é necessário o rompimento com o capitalismo e a reconstrução da sociedade com base em um programa socialista – nacionalizar os bancos e as grandes empresas, e trazê-los sobre um plano comum de produção de acordo com os interesses dos trabalhadores e da juventude.

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